Alunos da Escola Municipal Alcântara Machado, localizada no Real Parque, na Zona Sul de São Paulo, compartilharam experiências e apresentaram a realidade do ensino público a estudantes da escola Avenues, instituição privada localizada na mesma região, e que tem mensalidade superior a R$ 10 mil.
A troca fez parte de um projeto de elaboração de um jornal desenvolvido durante as aulas da professora de língua portuguesa da Avenues, Tatiana Oliveira.
A proposta era trabalhar o gênero textual. Segundo Tatiana, durante o processo da primeira edição, os alunos levaram a ela a necessidade de falar sobre os contrastes do bairro em que a escola estava localizada.
Por trás dos vidros das amplas janelas que circundam o prédio da escolaAvenues — cuja anuidade chega a custar R$ 133 mil — é possível ver o contraste entre os condomínios de luxo e as casas da comunidade do Jardim Panorama, ambos na Zona Sul.
Partindo da premissa de unir vozes e realidades perto fisicamente, mas distantes economicamente, a segunda edição do jornal simbolizou uma parceria entre as duas escolas.
“Cada aluno do quarto ano poderia escolher sobre o que eles gostariam de escrever. Alguns quiseram escrever na própria língua, como, por exemplo, nossos alunos coreanos. Outros alunos escreveram sobre a cidade e foi muito forte para eles essa questão das duas realidades”, conta Tatiana.
Os alunos da Escola Municipal Alcântara Machado foram convidados a participar da elaboração da segunda edição do jornal. As escolas também programaram visitas aos respectivos prédios para que o projeto fosse para além dos muros.
“O jornal foi feito como uma forma de dar voz para as crianças e mostrar que eles podem escrever sobre o que eles quiserem. Eu entrei em contato com a EMEF aqui do Real Parque e a equipe do 5º ano de lá abraçou a ideia também. Foi muito bonito porque os alunos de lá passaram pelo mesmo projeto que os alunos daqui”, conta Tatiana.
A coordenadora pedagógica da EMEF Alcântara Machado, Cláudia Perez, conta que a ideia foi bem recebida na instituição.
“A gente ficou muito animado porque a única possibilidade de conseguir publicar um jornal, principalmente pela parte financeira, é com parceria. Infelizmente a gente não teria como fazer uma publicação dessa na escola pública, então foi uma chance de a gente conseguir fazer esse projeto acontecer. Eu achei bem legal essa ideia de unir esses dois mundos bem diferentes”, diz ela.
Cláudia relembra que, durante o primeiro encontro, os alunos da EMEF se sentiram tímidos, mas que logo depois começaram a brincar e desenvolveram amizades com os estudantes da Avenues.
“Eles jogaram bola, pularam corda, correram pelo pátio. Isso ajudou a dar uma relaxada nos nossos alunos para que eles pudessem fazer o workshop misturado, os quintos anos daqui se misturaram com os quintos anos de lá. Aos poucos foi passando esse medo de entrar lá, mas eles voltam falando dessas diferenças que viram lá que não tem aqui.”
Os professores contam que as visitas nas escolas começaram pelo local das brincadeiras. Na EMEF Alcântara Machado, pinturas no chão e nas paredes feitas por meio de doação de moradores do Real Parque eram o orgulho dos alunos. De acordo com os estudantes, assim que os visitantes da Avenues chegaram brincaram nas amarelinhas coloridas no chão.
“A gente conheceu a vida uma das outras e não é por isso que muda. Uma pessoa não é mais legal que a outra porque ela tem as coisas mais que as outras. Para a gente é tudo igual. Com o grupo e tal fez a gente enxergar melhor as coisas”, disse a aluna Juliana do 5º ano da Avenues.
Em entrevista ao G1, tanto os alunos da Avenues, quanto os da EMEF disseram que uma coisa que chamou a atenção foi a diferença na relação deles com a escrita. Enquanto os alunos da Avenues acharam muito legal o fato de os alunos utilizarem muito os seus cadernos e treinarem a letra, os da EMEF ficaram encantados pela grande interação com a tecnologia que os alunos da escola vizinha tinham.
“Eu achei muito legal porque eu fiz muita amizade com os alunos de lá e achei muito legal também que eles falam inglês e que eles sabem escrever de outros jeitos mais do que nós”, disse Alan, de 11 anos, que estuda na EMEF Alcântara Machado.
No jornal, os alunos da EMEF ressaltaram os projetos da escola dos quais se orgulhavam. Uma das reportagens feitas pelos alunos da escola municipal falou sobre personalidades afro-brasileiras.
Já na visita à escola Avenues, os estudantes da EMEF conheceram o prédio de 7 andares da instituição em que os alunos de todas as idades se comunicam em inglês. A escola também tem sedes em Nova York e na China, e uma nova também está sendo construída no Vale do Silício.
No material escolar, constam aparelhos como computadores e tablets. Além das disciplinas do currículo tradicional, os alunos da escola que se define como “uma nova escola de pensamento” têm acesso a matérias diversas, como, por exemplo, inovação social.
“Eu acho isso [interação entre as escolas] fundamental. Ninguém vive em uma bolha, e eu acho que uma das principais propostas da Avenues é criar alunos muito antenados com tudo o que está acontecendo no mundo e capazes de transformar algumas realidades que a gente vê por aí. A única maneira de a gente conseguir isso é conhecendo é saindo da sala de aula. É vendo outras realidades, conversando”, completa Tatiana.
FONTE: G1