O Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo fez os primeiros testes com protótipos de capacetes para respiração mecânica nesta quarta-feira (13). Os equipamentos funcionam como respiradores menos invasivos para pacientes com Covid-19 e são similares aos que foram usados na Europa para enfrentar a pandemia. Uma das principais características da doença é o alto índice de pacientes internados que precisam fazer uso de respiradores.
A Bolha de Respiração Individual Controlada (BRIC) pode evitar intubação em até 35% dos pacientes infectados pelo novo coronavírus, segundo a Life Tech Engenharia, marca brasileira que desenvolveu o produto. O equipamento foi testado em máquinas e seu uso em humanos foi demonstrado no HC com dois voluntários. As análises no hospital foram feitas sob a supervisão do professor da Faculdade de Medicina da USP, Marcelo Amato, ao lado do pneumologista responsável pela UTI do HC, o médico Carlos Carvalho.
Os testes em pacientes devem ocorrer após aprovação da Comissão de Ética Médica do Hospital das Clínicas. Os criadores esperam que isso deve ocorrer em até 10 dias e já preparam um lote de 1 mil unidades do equipamento para diversas instituições de São Paulo, Bahia e Minas Gerais.
Para criar o capacete, profissionais da área da saúde, da engenharia e da indústria se juntaram para conceber um produto adequado a pacientes de Covid-19 que estão internados e precisam de auxílio na respiração, mas em fase de tratamento anterior à UTI. A cerca de R$ 627 a unidade, eles são mais baratos do que os respiradores tradicionais e também são considerados menos invasivos, porque não requerem que o paciente seja intubado.
O produto ainda aguarda liberação da Anvisa. Um novo teste, com mais voluntários e outros parâmetros de avaliação, deve ser feito no Hospital das Clínicas nos próximos dias.
De acordo com o engenheiro Guilherme Thiago de Souza, que liderou o projeto, uma de suas principais vantagens em relação aos respiradores comuns é o menor potencial de disseminação do coronavírus.
“Sua vedação foi feita de forma que não ocorram vazamentos que podem causar a disseminação do vírus. A saída de ar ocorre pelos filtros hospitalares, projetados e construídos para essa finalidade”, explica Guilherme.
Necessário para o uso de respiradores tradicionais, o momento da intubação, quando os médicos inserem um tubo nas vias respiratórias do paciente, é considerado crítico para contaminações porque provoca grande dispersão de partículas do vírus.
Fisioterapeuta intensivista envolvido no projeto, Thiago Marrachini destaca que o capacete permite que a oferta de oxigênio seja regulada de acordo com as necessidades do paciente.
“A BRIC é um capacete, uma vestimenta estanque que proporciona um ambiente para o controle do oxigênio. Com seu uso, é possível configurar nos ventiladores uma oxigenação entre 21% a 100% de fração inspirada de oxigênio e implementação de pressão positiva, de acordo com a necessidade clínica”, diz Marrachini.
Segundo especialistas ouvidos pelo G1, capacetes respiradores não substituem os equipamentos tradicionais, mas podem ser alternativas para casos menos graves da doença ou, ainda, para ganhar tempo até o paciente ser intubado – no caso da falta de respiradores, por exemplo.
Para o médico Laerte Pastore, que coordena a UTI do Sírio-Libanês, a dificuldade de adaptação ao equipamento – alguns pacientes podem se sentir claustrofóbicos – é uma de suas principais desvantagens.
Em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, o diretor de pneumologia do Hospital das Clínicas, Carlos de Carvalho, falou sobre a possibilidade de usar métodos de ventilação não invasiva.
“Nós temos trabalhado no HC junto com a Secretaria da Saúde no sentido de avaliar respiradores e eventuais soluções para a ventilação mecânica, se conseguirmos abreviar o tempo de ventilação invasiva ou até retirar essa necessidade, com o uso de capacetes”, disse Carvalho.
“Com isso, teríamos a opção de ampliar o rol de ventiladores e poderíamos fazer a retirada da ventilação mecânica mais precoce porque teríamos opções após a extubação para manter os pacientes em enfermaria, bem oxigenados, sem precisar de sedação”, completou.
Diante da pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2), o Brasil enfrenta grande dificuldade para aumentar o número de ventiladores mecânicos, equipamentos essenciais para tratar os casos mais severos da doença Covid-19. Esse entrave tem três causas principais:
Indústrias nacionais e estrangeiras alegam que o número de encomendas de respiradores mecânicos disparou desde o início da pandemia. O mundo inteiro quer comprá-los porque o aparelho é decisivo para garantir a sobrevivência de pacientes com falta de ar intensa.
Na semana passada o governo de São Paulo anunciou que aguarda a encomenda de 3 mil respiradoras comprados da China por US$ 100 milhões, o equivalente a R$ 550 milhões. Mas o Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou a investigação de irregularidades na compra sem licitação.
Antes disso, o Ministério Público de São Paulo já tinha aberto outro inquérito para investigar essa compra sem licitação. O promotor José Carlos Blat se baseou em uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo que aponta que os respiradores tiveram o preço médio de R$ 180 mil cada, quando modelos similares no mercado custariam R$ 60 mil, o que poderia caracterizar improbidade administrativa.
Em nota, o vice-governador paulista disse que o fornecedor chinês foi escolhido por causa do prazo de entrega dos aparelhos, já que o momento é de priorizar a rapidez para salvar vidas, conforme o decreto estadual de calamidade pública em São Paulo.
A Secretaria Estadual da Saúde também respondeu ao G1 e alegou que o Ministério da Saúde comprou toda a produção nacional dos aparelhos e não repassou ao estado de São Paulo. A pasta negou o sobrepreço dos equipamentos e disse que, inclusive, consultou outras sete companhias antes de escolher esta.
FONTE: G1